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"Eu sou à esquerda de quem entra. E estremece em mim o mundo. (...) Sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro. Sou um coração batendo no mundo." (Clarice Lispector)

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010



Nestes dias vi uma peça no CCSP maravilhosa, chamada Clarices.
Ah... como eu adoro a Clarice!
Vê-la representada em 3 fases foi fantástico. A mulher madura insone que toma café e fuma seu cigarro sentindo o Nada. A a jovem questionadora que se irrita com o simples fato de sentir, e a menina que é a melhor amiga das galinhas.

Sinto que sou um tanto Clarice, na verdade acho que todas as mulheres são Clarices, algumas mais...outras menos. Se um dia eu tiver uma filha ela se chamará Clarice. Quem será mais feminina?

Eu sempre vi pessoas que tinham um autor preferido que sempre tinham um texto ou frase na ponta da língua, eu era orfã de um autor, apesar de ler bastante, citava sempre livros que eu adorei ler, mas eu adorva o livro não o autor, nem todas as obras me despertavam o mesmo encanto.
Até o momento que me apaixonei por Clarice, então eu entendi...

Vou deixar aqui um dos trecho que gosto, e como sempre se encaixa.

Se eu Fosse Eu - Clarice Lispector

"Quando não sei onde guardei um papel importante e a procura se revela inútil, pergunto-me: se eu fosse eu e tivesse um papel importante para guardar, que lugar escolheria? Às vezes dá certo. Mas muitas vezes fico tão pressionada pela frase "se eu fosse eu", que a procura do papel se torna secundária, e começo a pensar. Diria melhor, sentir.
E não me sinto bem. Experimente: se você fosse você, como seria e o que faria? Logo de início se sente um constrangimento: a mentira em que nos acomodamos acabou de ser levemente locomovida do lugar onde se acomodara. No entanto já li biografias de pessoas que de repente passavam a ser elas mesmas, e mudavam inteiramente de vida. Acho que se eu fosse realmente eu, os amigos não me cumprimentariam na rua porque até minha fisionomia teria mudado. Como?não sei.
Metade das coisas que eu faria se eu fosse eu, não posso contar. Acho, por exemplo, que por um certo motivo eu terminaria presa na cadeia. E se eu fosse eu daria tudo o que é meu, e confiaria o futuro ao futuro.
"Se eu fosse eu" parece representar o nosso maior perigo de viver, parece a entrada nova no desconhecido. No entanto tenho a intuição de que, passadas as primeiras chamadas loucuras da festa que seria, teríamos enfim a experiência do mundo. Bem sei, experimentaríamos enfim em pleno a dor do mundo. E a nossa dor, aquela que aprendemos a não sentir. Mas também seríamos por vezes tomados de um êxtase de alegria pura e legítima que mal posso adivinhar. Não, acho que já estou de algum modo adivinhando porque me senti sorrindo e também senti uma espécie de pudor que se tem diante do que é grande demais".
(Texto extraído do livro A Descoberta do Mundo, Clarice Lispector, editora Rocco, pg. 156).

7 comentários:

  1. Que inveja de vc *-*
    Adoraria ter assistido também, deve ter sido fantástico *_*
    Adoro a Clarice também... afinal, quem não, né?! x)~
    Adorei o texto e obrigada pelo resgate
    não conhecia esse *-*

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  2. Também tomo pra mim esse texto. Irretocável como versos sagrados de alguma bíblia. Também me considero um pouco Clarice, apesar de ser homem. Meu primeiro e estremecedor contato com ela foi com o livro "Água Viva", que, durante um bom tempo foi meu livro de cabeceira. De lá sempre saiam versos inspiradores, loucos, que não se prendem ao limite da mente, pois sempre quer ir além, quer mais. Clarice sempre rompe algo dentro de nós para libertar o que não pode ser aprisionado. Também temos uma inquietação na alma que às vezes relampeia...Este comentário já está tão grande que mais parece uma postagem...rs.

    Só pra encerrar, temos a versão masculina de Clarice: Caio Fernando Abreu, que bebeu das águas clariceanas na fonte. A sensibilidade do Sentir também potencializa a dor.

    Pena eu ter perdido essa peça...

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  3. Faltou ainda dizer que a foto que vc escolheu é linda demais!

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  4. =)
    Que bom que vocês também tocaram Clarice!
    Água viva é o meu livro preferido.
    Agora Caio eu estou conhecendo... ainda estou na fase de estranheza e curiosidade.

    Encontrei esta "profecia" que me é muito familiar ^^
    "Ah, fumarás demais, beberás em excesso, aborrecerás todos os amigos com tuas histórias desesperadas, noites e noites a fio permanecerás insone, a fantasia desenfreada e o sexo em brasa, dormirás dias adentro, noites afora, faltarás ao trabalho, escreverás cartas que não serão nunca enviadas, consultarás búzios, números, cartas e astros, pensarás em fugas e suicídios em cada minuto de cada novo dia, chorarás desamparado atravessando madrugadas em tua cama vazia, não conseguirás sorrir nem caminhar alheio pelas ruas sem descobrires em algum jeito alheio o jeito exato dele, em algum cheiro estranho o cheiro preciso dele"(...)Caio Fernando Abreu

    ps: Gosto tanto dos seus comentários que muitas vezes não respondo com medo de estragar...

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  5. Tali,

    Nossa, já tomei porres desse texto. De tudo. Sou um completo apaixonado por esse homem-nervo-exposto. Minha amiga Tali, fomos expulsos do paraíso, então, nunca seremos felizes?

    Me ocorreu agora, pra este momento em que estou aqui no teu blogue um trecho mais ou menos assim: ..."E tem o seguinte, meus senhores: não vamos enlouquecer, nem nos matar, nem desistir. Muito pelo contrário: vamos ficar ótimos e incomodar bastante ainda!"...

    Continue escrevendo. Isso faz a gente vivo! Se te amarem pelo que você escreve, será bom. Mas se sentirem-se incomodados, então será ótimo!

    bjs

    Perseu, o anti-herói

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  6. Perseu

    Se fomos expulsos do paraíso não sei, mas que não somos deste mundo e viemos para incomodar e intrigar isso eu tenho certeza!
    "...seremos felizes?" também me pergunto...

    Obrigada por tudo!!
    Eu ja estava escrevendo um texto sobre tristeza, mas agora já não me cabe mais, deixa para outro momento. ;)

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  7. Sim, fomos expulsos do paraíso, porque provamos da árvore do conhecimento do bem e do mal...Agora que sabemos não podemos mais voltar mesmo que as portas estivessem abertas e sem anjos com espadas flamejantes, nunca mais conseguiríamos voltar, porque conhecemos a nossa própria nudez. E ela nos assusta. O problemas é ficarmos paralisados diante do medo.

    Vc ia falar sobre tristeza? Sabe, acho que nem sempre a tristeza é "triste". Escute uma música que evoque este sentimento tão humano quanto a alegria, ponha as mãos no teclado e deixe sua alma escorrer através delas. Vai ficar lindo, mesmo que triste.

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